Conhecimento

Da Obrigação de Prestar Alimentos

A obrigação de prestar alimentos pode inverter-se ao longo da vida e gerar dilemas familiares difíceis. Em que casos pode recusar-se essa obrigação? A Bárbara Figueiredo responde num texto publicado originalmente no Diário de Coimbra

28 de Abril de 2025

Artigo de opinião de Bárbara Figueiredo no Diário de Coimbra.

Diz-nos o n.º 1 do artigo 2003.º do Código Civil entender-se por alimentos tudo o que é indispensável ao sustento, habitação e vestuário, acrescentando o n.º 2 que os alimentos compreendem ainda a instrução e educação do alimentado, no caso de este ser menor.

Tipicamente, associamos os alimentos, ou a obrigação de os pagar, à relação entre pais e filhos, normalmente no âmbito de um divórcio ou separação de pessoas e bens. Afinal, é (quase) inquestionável a obrigação de assegurar o sustento, educação e bem-estar dos filhos até que estes atinjam a maioridade.

Mas o que muitos desconhecem é que esta obrigação não é unidirecional. De facto, no nosso ordenamento jurídico, os deveres de assistência entre familiares – porque é disso que falamos – estendem-se para além da infância (um pai é obrigado a pagar alimentos ao filho até aos 25 anos, desde que este esteja a estudar)  e podem mesmo inverter-se ao longo da vida.  De facto, nos termos do artigo 2009.º do Código Civil está obrigado a prestar alimentos o cônjuge ou ex-cônjuge, os pais, os filhos, os avós e os irmãos, devendo seguir-se a ordem enunciada. 

Ou seja, tendo presente que os alimentos serão proporcionados aos meios daquele que os presta e à necessidade de quem os recebe, um ex-cônjuge pode ser condenado a prestar alimentos após o divórcio. Um filho adulto pode ser legalmente obrigado a sustentar um pai idoso. Um irmão pode ter de ajudar outro irmão em dificuldades. 

Temos, assim, que, para além dos casos clássicos de pensão de alimentos (por parte de pais a filhos menores e até ao ex – cônjuge) está prevista a possibilidade de, por exemplo, um filho ter que pagar uma pensão de alimentos ao seu pai, exigindo-se, naturalmente, que aquele possa pagar e que este precise de receber. Capacidade económica de um lado, Necessidade do outro. 

Mas o que significa, na prática, “necessidade”? E será justo que alguém tenha de ajudar familiares com quem, por hipótese, não tem qualquer relação afectiva? Se, por exemplo, o pai que vem agora pedir alimentos nunca cuidou do filho que agora pretende que o auxilie financeiramente, será justo ver-se o filho obrigado a auxiliar? Ou se viveu sempre de forma irresponsável, nunca procurando trabalhar? 

Para evitar decisões injustas, todos os circunstancialismos do concreto caso em análise devem ser devidamente ponderados. Assim, ainda que exista capacidade e necessidade, podem recusar-se os alimentos com base no princípio da boa-fé, se, por exemplo, o pai que agora pede alimentos esteve totalmente ausente da vida do filho. Temos, assim, a boa–fé como uma válvula de escape passível de conformar a letra da lei com a moral vigente.

Ser um Jedi do direito.